Crack é barato, dá pouco ou nenhum lucro para o traficante e, por isso, não é visto como algo rentável pelos bandidos. A sequência de afirmações — transformadas em verdades sobre a droga — não resiste ao peso de um número: 300. É o valor, em reais, que o tráfico pode faturar, por dia, com um único usuário de crack. O vício leva uma pessoa a fumar até 30 pedras de 1 grama diariamente, o que faz da droga um negócio tão vantajoso para os bandidos quanto a cocaína.
A partir desta segunda-feira, o EXTRA mostra, na série “Os mitos do crack”, que essas e outras afirmações sobre o crack são derrubadas por especialistas e autoridades da área de segurança pública.
— O crack, hoje, certamente dá lucro para o tráfico. Entendo que é uma questão de mercado, uma estratégia. A cocaína, por exemplo, dá mais lucro, mas é mais cara para ser produzida. O preço do crack é mais baixo, mas é mais barato fazer, também — analisa o secretário de Segurança do Rio, José Mariano Beltrame.
O uso ininterrupto do crack faz com que o vício fique caro. É daí que vem o ganho dos traficantes. Um usuário de cocaína consome, em média, dois papelotes de um grama de dia, segundo o pesquisador Luís Flávio Sapori, coordenador do Centro de Estudos e Pesquisas em Segurança Pública da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de Minas Gerais e autor de trabalhos sobre a droga há mais de 20 anos.
O preço de cada grama de cocaína fica em torno de R$ 50 nas favelas do Rio — segundo a delegada Valéria Aragão, titular da Delegacia de Combate às Drogas (DCOD) — o que leva a um faturamento diário, para o tráfico, de R$ 100 por usuário. Menos do que os R$ 300 que um único viciado em crack pode render.
Para Valéria, o crack é tão lucrativo quanto a cocaína:
— O usuário do crack é o consumidor mais cativo que existe. Por ser barato, o dependente não para de usar.
— Quem usa o crack é compulsivo, capaz de ficar quatro dias ininterruptos usando a droga. No fim, fica caro porque tem esse efeito impulsivo. O barato sai caro. O tráfico diz que o crack é ouro. Os traficantes são comerciantes, e raciocinam dessa forma: a partir do momento em que há uma demanda, há lucratividade, eles investem — afirma Sapori.
Uma prova do interesse dos traficantes na venda do crack está no crescimento das apreensões das pedras. Enquanto as ocorrências com cocaína e maconha se mantêm estáveis, os números do crack subiram 620% nos últimos seis anos, segundo o Instituto de Segurança Pública. No mesmo período, as ligações para o Disque-Denúncia (2253-1177) sobre o tema cresceram 970%.
No início, venda por pressão de traficantes de São Paulo
Em 2003, a Polícia Civil fez a primeira grande apreensão de crack, ao encontrar 3kg das pedras no Complexo do Jacarezinho. Para a policial e ex-deputada federal Marina Maggessi, que participou da ação, a ideia de que o tráfico não gosta de vender a droga é coisa do passado:
— Antigamente, havia a mentalidade de que a venda do crack atrapalhava. Atualmente, não é assim. Tudo que tem uma grande demanda, como o crack, dá lucro.
A explosão da droga no Rio ocorreu em 2006. O delegado Marcus Vinícius Braga, que era titular da DCOD em 2007, explica que a maior facção criminosa do estado, preocupada com a perda de clientes e as apreensões da polícia, começou a vender o crack, cedendo à pressão dos bandidos paulistas:
— A facção mais antiga e violenta passou a aceitar isso. Depois, a segunda maior também passou a vender. Agora, todas as favelas dominadas por essas duas facções se sustentam com o crack.
A delegada Valéria Aragão afirma que todas as facções criminosas do Rio já comercializam o crack. A cocaína continua vindo de fora do Brasil (basicamente da Bolívia, Colômbia e Peru) e é transformada em crack em laboratórios clandestinos nas próprias favelas cariocas.
Se livrar do crack e se livrar do vício e se libertar financeiramente.